*Franklin Jorge
Quando nasceu?
08 de maio de 1957
Onde?
Em Natal, na Maternidade Januário Cicco
Como se chamam seus pais?
Antônio Cavalcanti Dantas e Ana Gurgel Cavalcanti Dantas
Onde nasceram seus pai?
Meu pai era paraibano e minha mãe nasceu em Caraúbas (RN)
O que herdou de seu pai?
Do meu pai herdei um apurado senso de organização. Se ele tivesse tido oportunidade, provavelmente, seria bibliotecário. Adorava música. Muito eclético, sua seleção incluía românticos como Altemar Dutra, Dalva de Oliveira, Agnaldo Rayol; também sertanejos, MPB e o melhor do rock. Apresentou-me Dire Straits e Van Halen. Teve uma coleção de gravações em vinil, CDs e fitas cassete, catalogada e codificada por gênero e autor.
E de sua mãe?
De mamãe herdei a garra para criar uma grande família trabalhando. Ela veio morar em Natal ainda mocinha e já trabalhava em farmácia. Foi vitoriosa como trabalhadora e mãe de 6 filhos. Eu, 20 anos depois, reduzi a filharada em 50% e consegui conciliar família, trabalho e curso superior.
Quem é vc?
A pergunta mais difícil de responder. No momento, ainda sou servidora pública, bibliotecária da UFRN, espírita, artesã, jardineira, cozinheira, escrevinhadora… uma eterna garimpeira e “caçadora de mim”, como cantou Milton Nascimento. Contudo, continuo tentando descobrir quem sou.
Dê-me fatos para esclarecimento de heranças.
A mais preciosa herança que meus pais me favoreceram foi a educação. Filha de viajante e funcionária pública, concluí graduação e mestrado, nível de educação que eles não tiveram oportunidade. Mesmo querendo ser bióloga, ou nutricionista, ou química, pesquisadora… Iniciei minha graduação em Ciências Sociais, aqui na UFRN e concluí Biblioteconomia 10 anos depois, na bucólica UFPA (Belém/PA).
Como foi a sua infância?
Doces lembranças da infância: as fortes chuvas que faziam a Rua das Dunas (Rocas) virar um caudaloso rio. Olhava pela janela e via as crianças tomando banho de chuva e nadando naquela água suja e barrenta. Morria de inveja. Depois, as lembranças sonoras da salada musical do meu bairro. Ao lado da minha casa, havia um Terreiro de Umbanda. O bater visceral dos tambores e a curiosidade de criança me faziam colocar um tamborete em cima de uma cadeira para ver aquela dança bonita e cheirosa. Na esquina, um cabaré tocando Valdick Soriano e sempre alguém “roendo” um amor não correspondido. Na outra esquina, a Assembleia de Deus e seus cânticos em altíssimo volume, como se quisessem garantir que as coisas do Céu precisassem ser ouvidas no volume mais alto para ser seguidas. No outro quarteirão, O Balanço do Morro e seu Samba sazonal, que também gostava de assistir, mas nunca nem tentava imitar. Nunca tive molejo para o samba. Bem antes, ainda não alfabetizada, recordo das leituras dos livrinhos infantis feitas por minha mãe. Eu pedia tanto que ela lesse mais uma vez, que chegava a decorar todo o conteúdo de cada página. Mamãe blefava dizendo que eu já sabia ler e me mandava “recitar” todo o texto decorado. Ela se divertia com isso e as pessoas acreditavam.
Como brincava?
Brincadeiras de menina: casinha de bonecas; cozinhado com caroços de jaca, em panelinha de barro e fogo de lenha no sítio do meu avô, em São José de Mipibu; amarelinha, canções de roda na calçada…Santa inocência vivida nas ruas suburbanas das Rocas. Nos finais de semana, havia as brincadeiras mais especiais com a prima urbana e querida que morava na Afonso Pena. Lembro-me dos passeios pela rua ainda com areia branca recebendo o primeiro calçamento; das excursões ao Morro de Mãe Luiza que deixavam as batatas das pernas super doídas; das idas à praia dos Artistas, no final da Infância, início da curiosa adolescência, já desejando participar das matinês do ABC. Mas, tinha mesmo era cara de menina, até os 15 anos era barrada no baile.
Mais fatos.
Mais fatos… são tantos fatos. Primeira filha de uma série de seis. Com um único bendito fruto entre as mulheres. Meu irmão nasceu três anos depois de mim e meu mundo ruiu. Acabou o meu reinado. Arengava muito com ele e a culpa era sempre minha, pois era a mais velha. Depois dele, a produção foi acelerada. Quatro irmãs, uma a cada ano, e eu correndo delas. Afinal, havia uma boa diferença de idade que me fazia gostar mais de brincar com outras meninas da minha faixa etária. Sempre gostei do mar, de ir à praia. Menina crescida, quase mocinha, ia sempre. Até sozinha. Ia a pé. Atravessava a Brasília Teimosa e rápido chegava ao momento mais desejado do dia. Ali, eu era a dona do pedaço. Pulava nas pedras com os meninos. Mergulhava para procurar peixinhos coloridos; ver o bailado das algas, os pequenos camarões, moreias… Uma delícia. São quadros vivos e coloridos que permanecem cuidadosamente armazenados nas gavetas da memória, com backup nos arquivos do coração.
Quando deixou sua terra?
Deixei minha terra para morar em Belém (PA) em 1980, já universitária e mãe de dois filhos. Não queria ir. Não me imaginava morando numa cidade sem praia. Mas fui. Demorei a gostar. Descobri as praias de rio, os igarapés, o Ver-o-Peso, as pupunhas, o açaí legítimo. Terminei gostando. Nem queria mais voltar. Precisei mudar de curso. Não consegui vaga em Ciências Sociais. Consegui em Filosofia, Geografia e Biblioteconomia. Optei pelo último achando que iria tentar vaga novamente em Ciências Sociais. E não é que gostei da detalhista biblioteconomia? Também pensei: se um dia voltar para Natal, terei mais chance de trabalho, já que não havia, nos anos 1980, o curso aqui na UFRN. Foi o pensamento mais acertado da minha vida.
Que coisas pretende fazer?
Adoro essa palavra “coisas”. Ela é tão emblemática. Fui criticada porque a usei várias vezes numa crônica. Acho que três ou pouco mais. Fiquei tão motivada com a crítica que escrevi outra crônica em homenagem a essa palavra versátil, generosa, mãezona. Tenho feito muitas coisas nesses tempos de reclusão. Nunca trabalhei tanto. Quando dá vontade. E, geralmente dá. O bom é que, às vezes, posso escolher a hora. Também é um perigo. Sempre gostei de trabalhar à tarde e à noite. Se for algo prazeroso, sigo madrugada adentro. Gosto de fazer várias coisas ao mesmo tempo. Exercito a atenção seletiva. Por exemplo: coisas na cozinha e ouvir palestras, cursos, audiolivros… É desafiador fazer diferentes atividades ao mesmo tempo. Testo minha coordenação. Escovar os dentes e pentear os cabelos. Cuidar do jardim e participar de lives. Não consigo fazer apenas uma atividade. Até mesmo o meu trabalho remoto faço concomitante com algo em segundo plano. Ultimamente tenho ouvido clássicos da literatura espírita, lido alguns livros de poesia e feito artesanato (pintura, crochê, terrários…), inventado doces e escrito poemas ou sonhos. Esses últimos bem pianinho. E, especialmente este último – piano –, ainda está nos meus planos aprender a tocar. Ou harpa. Quem sabe?