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Rossini Pérez, o artista que Natal esqueceu

Uma Nota divulgada na última quarta-feira (18) pelo Museu de Arte do Rio informou sobre o falecimento de um dos mais ilustres potiguares, atuante em três continentes, em especial a África, para onde foi enviado pelo Itamaraty como representante da arte brasileira em diversas ocasiões. Por onde passou, ministrou cursos e contribuiu para a formação de novos artistas.

*Franklin Jorge

A morte de Rossini Quintas Pérez empobrece substancialmente a cultura visual contemporânea. Nascido em Macaiba, onde o seu pai vindo da Galícia e depois de Fortaleza, se estabeleceu com sua família, dentre os quais o próprio Rossini e o escritor Renard Perez, que escreveu a saga da paterna no livro Chão Galego. Seu pai calçou inúmeras ruas de Natal, ao tempo do prefeito Omar O´Grady, que terá sido um dos grandes prefeitos de Natal, cidade então “um tanto dorminhoquenta”, como a descreveu de maneira irretocável o poeta Jorge Fernandes, há muito esquecido.

Quando assumi a Chefia do Núcleo de Criatividade da Fundação José  Augusto, em 1979 – cargo especialmente criado para mim pelo professor Cláudio Emerenciano que exerci até 1985 -, achei que havia chegado a hora de darmos visibilidade à sua obra e aa de outros artistas, natalenses até então desconhecidos  entre nós,, como os primos Abraham, Aminadav e Ruth Palatnik, descendentes de judeus russos, nascidos em Natal. Lutei então denodadamente contra a inveja e a falsidade, para fazê-los conhecidos aqui. E, ao idealizar a Pinacoteca do Estado, agreguei ao projeto a criação da Oficina Rossini Quintas Perez, que seria a âncora das atividades formadoras de novos artistas e para isto obtive da Funarte a concessão de professores de gravura, entre os quais  Gianguido Bonfanti, Kasuo Iha, José Lima e José Paixão. Infelizmente, depois, o Núcleo  Criatividade e a Oficina Rossini Pérez caíram nas mãos de um combo de gestores ineptos e o que restou desse empreendimento, sob a gestão de Isaura Rosado, acabou jogado no lixo.

Tendo morado por quase 30 anos em Paris [o presidente François Mitterrand quis fazê-lo Cidadão Francês], a crítica francesa se referia a ele como um “maître graveur”, o último de sua espécie, com quem convivi e troquei correspondência desde 1970 até 2016, quando intentamos torna-lo conhecido entre os potiguares, um sonho que ele alimentou por décadas, pois amava a sua terra, que visitou pela última vez em 2012. Viera com o intuito de observar a Pinacoteca do Estado, para ter certeza que a sua obra ficaria ali bem guardada. Nessa ocasião ele deu muitas sugestões à secretaria de estado de cultura, mulher açodada e inepta, que se apropriara das instituições culturais com o apetite de uma sanguessuga em estado de abstinência.

Em 2015, na condição de diretor da Salas Natal, acompanhei o então prefeito de Natal e o secretário de cultura, em visita ao seu atelier à Rua Gastão Bahiana, 58, em Copacabana, que frequentei ao tempo em que morei no Rio de Janeiro, nos anos de 1970. Naquela ocasião, ficou acertado que ele exporia obras antigas e recentes, em dois eventos, um desses eventos em parceria com o Museu Nacional, que nos emprestaria 150 obras doadas pelo artista à sua valiosa coleção. O outro evento estava focado em uma paixão sua relativamente recente, a Fotografia, que ele elevara a uma inconfundível expressão artística. Além de suas gravuras e objetos, ele queria mostrar em primeira mão as fotografias que fizera de Natal, dentre as quais o registro das calçadas e construções remanescentes do tempo de sua mocidade inquieta e fatigada. Algumas dessas obras beiravam o abstrato e pareciam como que capturadas de um sonho. Quis, nessa ocasião, fotografar a atriz Sônia Santos e a mim e o fez de uma forma que pareciam pinturas. Infelizmente as mostras foram boicotadas por Dácio Galvão, que criou tantas dificuldades para a sua realização que nós, da Sala Natal, sentindo-nos desgastados, desistimos de levar adiante a empreitada que visava estabelecer um padrão para as futuras exposições da Funcarte.

Nessa última visita, passamos em sua companhia uma manhã inteira e o prefeito Carlos Eduardo Alves, ainda vivo e entre nós, poderá confirma-lo. Rossini fez então revelações que surpreenderam o nosso prefeito, sobre a Natal que ele conhecera, inclusive sobre algumas famílias e o prefeito Omar O´Grady, que contratara o seu pai para fazer o calçamento das novas avenidas de Natal.

Morreu Rossini sem realizar o seu sonho: ser conhecido e talvez reconhecido por nossos conterrâneos, Por traz dessa frustração, o longo dedo maléfico de um secretário boçal e ditatorial que há anos controla cultura e prefeitos incautos de Natal.

Voltarei ao assunto.

 

ACIMA: foto da inauguração da Oicina Rossin Pérez (arquivo).

 

Franklin Jorge, Editor de Navegos,  fundou a Oficina Rossini Quintas Pérez e a Pinacoteca do Estado do Rio Grande do Norte.

 

Registro da última visita de Rossini a Natal por Anderson Tavares de Lyra.