*Adalgisa Assunção
Hoje é sábado, um dia especial e justamente hoje, a saudade decidiu vir bater
à porta do meu quarto para me acordar. Chegou de forma sorrateira, acordou-
me e não me deixou mais. O Sol está brilhando lá fora e a saudade está aqui;
queimando meu peito. Mas hoje é sábado. O dia mais esperado da semana.
Sábado não é dia de sentir de saudade. Não combina de jeito nenhum.
Sábado é dia de muita coisa: de praia com os amigos; de tomar cerveja bem
gelada; de comer caranguejo e lamber os dedos. De comer ginga com tapioca.
De ver o sol se pôr na Ponta do Morcego. Sábado é dia de andar descalça pela
praia, enquanto as ondas beijam meus pés. É dia de acordar tarde; de fazer
compras; de ir ao cabeleireiro; andar despreocupadamente, sem importar com
o relógio. Decididamente, Sábado não é dia de sentir saudade.
É dia de fazer faxina: na casa e na alma. É dia de ir à livraria e procurar aquele
livro especial; ir ao caixa eletrônico consultar o saldo bancário; dia de pagar
contas e acertar contas; fazer a feira do mês; ir à feira do Alecrim comprar
frutas e verduras; sábado é dia de comprar CD e DVD; assistir filme depois do
almoço; dormir sem hora para acordar. É dia de manicura e pedicura. De cuidar
de unha encravada.
Dia de fazer trabalhos escolares; de revisar matérias; corrigir provas; de
arrumar os livros na estante; arrumar as gavetas, os armários e as despensas.
É dia de arrumar os pensamentos; lavar as roupas, os cabelos, as sandálias e
os tênis. Mandar os cachorros para o banho, tosa e depois levá-los para
caminhar na praça. Decididamente, sábado com saudade não combina.
É um dia ideal para curtir cultura inútil: assistir Luciano Huck e Rodrigo Faro na
TV; ler Contigo e Tititi. Dia de tomar banho de bica, de piscina ou de cachoeira.
É dia de visitar amigos queridos; de dirigir sem um lugar definido para chegar;
de se perder em pensamentos; é dia de fazer planos: de viagens; de férias; de
aula. Planos para o futuro.
Sábado é dia de boemia. De juntar amigos para uma cantoria, numa folia ou
simplesmente para jogar conversa fora. É dia de fofocar, contar piada. Dia de
alegria; churrasco ou feijoada. Dia de bom humor; é proibido estresse no
trânsito e preocupação com a hora. Afinal, sábado não é dia de trabalhar. É dia
de “malandrar”. Não é dia de bater ponto. Portanto, sábado não é dia para
saudade.
Dia de fazer juramento, portanto, somente hoje não me aborrecerei; não me
preocuparei; serei gentil e amável com todas as formas de vida; trabalharei
duro e honestamente; agradecerei por todas as bênçãos recebidas. Sábado é
dia de cuidar do espírito; rezar para Nossa Senhora e para o anjo da guarda.
É dia de banhos demorados; de cuidar do corpo, com óleos, cremes e
hidratantes perfumados; ficar cheirosa, dengosa, sentir-se estrela. Vestir roupa
nova. Sábado é dia de se atrasar: perder a hora de acordar, a hora do café, do
almoço e do jantar. Dia de esquecer o relógio num canto qualquer. Ora, sábado
não é dia de compromissos formais. Isto significa que não é dia para sentir
saudade.
Sábado é dia de agitar-se; correr na esteira, na praia ou na academia. Sair
para pedalar, nadar, badalar, se mostrar, ou simplesmente para “biritar”. É dia
de passear no shopping; marcar encontros com as amigas na cafeteria; comer
pizza com guaraná; camarão com vinho tinto só para variar. É dia de ler jornais
e revistas para se informar, ou apenas ler gibis, voltar a ser criança e se
divertir.
Mas, a saudade que me acordou neste sábado, tem nome e sobrenome;
identidade e CPF; endereço fixo e profissão; conta bancária, cartão de crédito;
certidão de nascimento; carrão da hora… Porém, descobri a duras penas, que
a saudade, assim como a raiva, o ressentimento, a mágoa, a tristeza, o medo e
o desejo de vingança, passa; tudo vira cinza; tudo é transformado em pó; tudo
fica para trás. Enfim, tudo é esquecido. Saudade, na minha vida não há mais
lugar para você. Vade retro; xô, passa fora. Vai embora e deixa-me viver.
Adalgisa Assunção – Professora – Poetisa.