*Franklin Jorge
Um dias desses, pensando que fugiria do tédio, tornei-me membro de uma dessas comunidades na qual as pessoas costumam fazer as perguntas mais inesperadas e que, portanto, se tornam difíceis de responder, tais como, se você arruma seus livros na estante pelas cores das capas, formatos, se já teve alguma vez ereção lendo livros de Jorge Amado, se Dan Brown é melhor do que Proust etc. Se Capitu traiu mesmo Bentinho ou se Bentinho não teria uma queda por Escobar…
Há quem pergunte quantas páginas você lê por minuto ou como reage ao sentir-se entediado lendo certos livros. Há também quem misture, de cambulhada, Dostoiévski, Tolstoi e Górki, grandes escritores e um mero propagandista do stalinismo. Enfim, uma mistura indigesta e paradoxal que surpreende em uma comunidade amantes da literatura.
São tantas as questões que são postas que ficamos tontos, mas também podemos nos divertir ao avaliar quão equivocadas são tais questões ou, até didáticas ou instrutivas, pois sempre podemos extrair lições de aparentes parvoíces. Entendemos que a maioria é bem-intencionada e se esforça, sinceramente, para desenvolver o gosto pela leitura.
Contudo, no meio de tudo isto, podemos nos deparar com questões intrigantes, como a de um leitor que sugeriu um hipotético encontro entre Settembrini e Quincas Borba, sem dúvida, uma sugestão instigante e desafiadora para leitores que se importam sinceramente com ideias. Fiquei a imaginar o diálogo entre dois soturnos com ideias extremas. Settembrini, que alguns estudiosos de Thomas Mann consideram um proto-nazista e o machadiano Quincas Borba, ambos possuídos por diferentes formas de loucura.
Uma moça revelou que, aos 13 anos, desejou tornar-se leitora e perguntou a seu pai que livro lhe sugeriria em sua iniciação e ele, sem hesitar, recomendou-lhe O príncipe, leitura que exigiria um conhecimento prévio que ela, por sua idade, só o teria muito excepcionalmente. Ela queria saber a razão dessa sugestão de leitura feita por seu pai a uma garota de 13 anos que não lera senão os livros escolares e não estaria preparada para ler Maquiavel. Achei por bem zoá-la, certo de que ela reagiria até de maneira grosseira. E disparei: Ou o seu pai a achava um gênio capaz de absorver a essência maquiavélica ou ele teria querido apenas zombar dela. Fiquei na expectativa da resposta, que não demorou: Você tem razão. O que ele queria era zoar comigo, respondeu bem humorada.
Eis uma espécie de leitura que tem propensões a se tornar viciante.