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Um novo pecado original?

Adão e Eva foram revividos! E se a vida surgiu na África, fará algum sentido, ou ficarão lacunas… em branco?

*Alexsandro Alves

[email protected]

 

I.

Eu parei para ouvir melhor pois pensei ter escutado mal. Algo não me soou direito. Voltei a fala várias vezes.

Precisamos ficar muito atentos com a fala. A guerra maior hoje é na cultura. E cultura, basicamente, é uma maneira de ver e de sentir e de pensar o mundo; sendo assim, a palavra e seu significado são elementos limítrofes entre nosso mundo e um mundo qualquer.

Há uma herança nas palavras, que pode ser modificada, mas que não podemos permitir que seja algo sorrateiro: precisamos estar atentos. Como sempre digo, desconfiados. Nunca escute o outro sem ligar seu senso de desconfiança.

Uma regra basilar: quanto mais inteligente o outro e quanto mais delicada e educada for a voz dele ou dela, interiormente arregale seus olhos e arrepie sua orelhas! Mas permaneça como que desinteressado, fazendo ar de brisa

Mas afinal, do que é que eu estou falando?

Eu assisti a um vídeo ontem, 15 de fevereiro, que me deixou pensativo o dia inteiro. Precisamos ter cuidado.

 

II.

O que significa ancestralidade?

Resposta do dicionário:

Substantivo feminino: 1. qualidade de ancestral. Particularidade ou estado do que é ancestral (que se refere aos antepassados ou antecessores). O que se recebeu das gerações anteriores; hereditariedade.

O que significa antepassado?

Resposta do dicionário:

Adjetivo: que já aconteceu há muito tempo; que é anterior; precedente. Que viveu numa época remota. Substantivo masculino: indivíduo de quem se descende; ascendente. Aquele ou aquilo que se originou anteriormente; antecessor. Que já ocorreu; que é anterior; precedente. Substantivo masculino plural: Antepassados. As gerações anteriores de uma pessoa; ascendência.

Minha fonte é o Dicionário Aurélio on line.

Notem que não há qualquer menção a questões de juízo de valor, de moral e de ética. Um ancestral é alguém de tempos idos. É isso.

 

III.

Agora vejam esse vídeo abaixo: em 1:46, o entrevistador pergunta para a entrevistada: o que é ancestralidade? A resposta da entrevistada parece correta, mas há problemas sérios com ela. Vejam.

 

IV.

Notaram a inserção de uma moralidade na definição? Ancestral é alguém que precisa ser, além de um antepassado, um homem ou uma mulher de altos valores morais. Isso é falso e é uma tentativa de reescrita da nossa história, a História do Brasil e de apagamento de nossa identidade nacional. Quero deixar bem claro antes de prosseguir: nós não somos um país negro, somos um país mestiço!

Bem, o que a definição da entrevistada, a senhora Ana Paula Campos, significa? Quais os prejuízos para a nossa História?

Primeiro, sabemos que temos um passado escravocrata. Sabemos o quão terrível é o racismo e lutamos contra ele. Sabemos das condições históricas pelas quais o homem negro e a mulher negra passaram, mesmo depois da Princesa Isabel, a Libertadora, assinar a Lei Áurea, sob intensa pressão das elites e das forças armadas para não fazê-lo! Conforme sabemos, a vingança das elites e das forças armadas veio pouco mais de um ano depois, no primeiro golpe militar de nossa História, aquele contra a Família Imperial.

No entanto, o fato de haver racismo ainda no Brasil, não pode servir para reinterpretações históricas e lexicais.

Quando a entrevistada afirma que apenas pessoas com conduta exemplar podem ser ancestrais, o que isso pode acarretar afinal?

Em apagar nossa ancestralidade portuguesa. No fim, é isso. É como se apenas a África e a extinta Pindorama fossem nossos ancestrais. Querem apagar o papel português na nossa História, querem apagar o homem e a mulher brancos.

Eu não quero afirmar que o português, então, tenha sido um indivíduo sem escrúpulos. Não é por aí. Mas condenar o português ao ostracismo porque traficava africanos para o Brasil, é apenas metade da História.

Porque o tráfico de africanos tem duas vias: é compra e venda. Quem vendia? Os africanos vendiam; quem comprava? Os portugueses compravam.

Então por que apenas o português merece ser desclassificado em relação a ser nosso ancestral? Quem vendeu o vizinho, o irmão, o parente, para o português e para outros europeus, por acaso está isento de culpa?

Não.

Tem tanta culpa quanto quem comprava!

Mas apagar de nossa ancestralidade o português, é ideológico. É uma tentativa de modificar nossa História por um viés ideológico de determinado grupo.

 

V.

Portanto, é também um apagamento de boa parte de nossa cultura! Na verdade, da parte mais importante de nossa cultura: a língua que falamos.

Através do português é que experimentamos o mundo, transformamos o mundo, nos adequamos ou não ao mundo. Nosso mundo é em português! Qual o sentido de apagar o povo que nos deu a forma e a estrutura de nossa vida? A parte mais preciosa de nossa existência é portuguesa: a Última Flor do Lácio!

Me parece que há um sentimento de vingança anacrônica rondando o Brasil.

Nós não somos culpados se nossos ancestrais venderam e compraram pessoas! Não carregamos culpa nenhuma por conta deles, sejam africanos ou portugueses, vendedores e compradores! Ficou para trás. E devemos nos insurgir contra qualquer tentativa de colocar em nós da contemporaneidade um pecado original, uma culpa de gerações.

E para ser irônico, falando em nossa culpa herdada dos outros, para indivíduos que se colocam como seguidores de religiões de matizes africanos, eles gostam de impor conceitos bem judaico-cristãos!