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Um quadrinho de faroeste existencial e humano

Ken Parker é um faroeste escrito por Giancarlo Berardi e ilustrado por Ivo Milazzo. Suas aventuras em meio a conflitos humanos com temas que envolve desde questões filosóficas existenciais, escravidão, história do boxe, revoltas trabalhistas, a questão de gênero que nem sonhava lá no início dos anos oitenta aparecer e demais inovações para esse gênero que marcou os poucos leitores da época que leram essas Histórias em quadrinhos.

*Renato de Medeiros

Devo confessar, faroeste é um dos gêneros que mais gosto e admiro na área do quadrinho.  Este entre outros gêneros parecem se destacar melhor nas páginas de nanquim e lápis em que suas histórias engenhosas nos deram divertimento e passatempos maravilhosos só comparável aos cowboys do cinema. A paisagem do deserto norte americano, o famoso “para além do oeste” que se transformou no famoso gênero “westerns” é cenário das histórias de confrontos, violência e ausência da lei, que se transformou em vários temas de clássicos tanto das HQs quanto do cinema. Os confrontos com indígenas, os conflitos de fora da lei e bandoleiros, as intrigas fronteiriças no México e com o próprio exercito americano, são temas recorrente e cenário de conflito nos quadrinhos de maneira em geral.  A violência dos duelos e conflitos de propriedades em um clima seco mostra que o oeste americano era terra sem lei e que abrigava tanto bandidos fora da lei, como colonos que buscam terras em busca de vida melhor. Nesse cenário se desenrolava as aventuras dos personagens e sua justiça em um cenário melancólico e rústico.

Filmes como Nos tempos das diligências (1939) de John Ford, Era uma vez no Oeste(1968) de Sergio Leone, Sete homens e um destino (1960) Antoine Funqua, Django (1966) de Sergio Corbucci, Por um punhado de dólares (1964) de Sergio Leone e tantos outros seguiam como inspiração para as HQs como também para o próprio cinema. O exemplo maior dessa influência é o filme os setes samurais de Akira Kurosawa baseado no filme de faroeste americano Sete Homens e um Destino de Antoine Funqua. Hoje em dia alguém poderia dizer que o gênero de faroeste esta ultrapassado ou caducou e que por isso explorar esse nicho nas hqs já não produziria boas histórias, mas isso parece não se aplicar na prática ao gênero já que a linha faroeste bonelliana continua produzindo boas histórias assim como o cinema, que o diga as refilmagens e novas produções como Djanto Livre (2012) de Quentin Tarantino, Tombestone (1993) de George P. Cosmatos, Kevin Jarre, Rastro de maldade (Bonnie tomahawk, 2015) de S. Craig Zahler, Dança com Lobos ( 1990) de Kevin Costner entre outros provam que o bom e velho gênero de faroeste assim como os quadrinhos tende a uma renovação perpetua trabalhando vários temas nesse universo.

Um exemplo tácito disso é o personagem bonelliano Tex e Zagor, que por sua longevidade evidencia como essas histórias são admiradas e lidas pelo mundo todo. Podemos mostrar ainda como o faroeste se destaca nas hq´s , na França Moebius nos maravilha com um álbum de faroeste chamado Bluebarry. Desse modo, Tex e suas histórias tem uma legião de admiradores que também adoram Blueberry, porque no caso de Blueberry, sua publicação se deu no Brasil muito irregularmente, assim não existe publicação seriada no país, mas esse é o mesmo caso de outra HQ ou fumetti (nome de quadrinho do italiano), chamado Ken Parker.

Ken Parker é um faroeste de primeira, escrito por Giancarlo Berardi e ilustrado por Ivo Milazzo, suas histórias começaram seguindo o velho cânone da linha Tex e companhia. Aqui no Brasil a primeira editora responsável pela publicação desse personagem foi a Editora Vecchi e durou até o número 54.  Durante esse tempo a publicação feita no país foi bem de forma esparsa e por grandes e na maioria das vezes pequenas editoras, como a Mythos que durou poucos números, Cluq e outras. Essa direção seguida pela HQ de Ken Parker durou até mais ou menos o número quatro da vecchi e depois enveredou para histórias humanas e brilhantes, mostrando a genialidade da dupla Giancarlo Berardi e Milazzo. A característica que difere o personagem Ken Parker é o caráter humano e dramático de suas histórias. Conduzido pelo magistral roteirista Giancarlo Berardi e ilustrado por Ivo Milazzo, o personagem desenrola suas aventuras em meio a conflitos humanos com temas que envolve desde questões filosóficas existenciais, escravidão, história do boxe, revoltas trabalhistas, a questão de gênero que nem sonhava lá no inicio dos anos oitenta aparecer  e demais inovações para esse gênero que marcou os poucos leitores da época que leram essas hqs.

Quem já leu a história Chemako: aquele que não se lembra, de Ken Parker nᵒ 5, sabe como Berardi inovou o gênero do faroeste nas HQs e os demais quadrinhos como Tex, Zagor, Blueberry e outras, perceberam que assuntos atuais poderiam se adequar a seus enredos e atualizá-las atraindo novos leitores e aumentando o publico desse nicho. Chemako é apenas uma entre tantas outras edições que Berardi escreveu e nos brindou com aventuras humanas, sensíveis e até poéticas. Assim como Alan Moore, Berardi é um roteirista sui generis, já que é um autentico escritor do mais elevado nível assim como Moore e marcou Ken Parker como sinônimo de caminho a ser seguido em termos de desenvolvimento de personagem e abordagem de tema, basta para provar sua competência lendo Julia Kendell editada atualmente pela Editora Mythos.

As HQs de Ken Parker têm todos os ingredientes do bom e velho faroeste e um destaque a mais, a capacidade do personagem de expor o sentimento e despertar emoções dos leitores em suas páginas nas aventuras decorrentes, com HQs que se tornaram clássicas, como por exemplo, a balada de Pat O´shane, Terras Brancas, Um Homem inútil, Terras de Gigantes entre tantos outras HQs produzidas pela saudosa editora Vecchi, talvez a única editora que posteriormente teve coragem de publicar Ken Parker foi a Mythos, que mais tarde publicou algumas poucas edições desse herói do faroeste.  Nesse sentido, não consigo entender como ninguém despertou por resgatar e publicar cronologicamente Ken Parker no Brasil, se não me engano é a Cluq uma editora pequena, que publica a edição no país, mas o preço é para dizer o mínimo proibitivo para a maioria dos admiradores de Ken Parker no Brasil, não são muitos, mas fiéis e que sacrificam muito para obter as edições antigas da editora vecchi e Mythos.

O humanismo do personagem foi o que destacou as histórias de Ken Parker. Berardi buscou desenvolver psicologicamente e dramaticamente tanto os personagens principais como secundários. A paisagem, onde se passa a história servindo de cenário e conflito em que as aventuras se passam, servem de ambiente dramático para desenrolar das histórias, reforçando dramas e situações pessoais. Enfim, Ken Parker é um faroeste fantástico, uma leitura magnífica, para o leitor mais exigente e também para o iniciante. Por isso, recomendo a leitura a todo o publico que gosta do gênero, além de quem não conhece recomendo a leitura. Assim, espero que essa modesta resenha sirva de estimulo para todos os leitores conhecerem e procurarem essa HQ. Ficamos por aqui, um abração.