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Uma imagem, mil palavras

Autor de resenha de livro de Gutemberg Costa publicada semana passada em Navegos, fundador e diretor de Redação desta revista analisa foto que ilustrou seu texto; para ele, o simbolismo da imagem destoa da consciência ecológica planetária dos dias atuais

Franklin Jorge

Recentemente, o ex-editor desta Navegos realizou um tour de force ao editorar texto que escrevi sobre apelidos, um gênero ainda pouco ou açodadamente estudado por pesquisadores sem repertório nem fundamentos. Curiosos vulgares que infamam a confraria de pesquisadores cautos.

Refiro-me a um dos insignes autores, dentre os que tiveram o seu nome associado às celebrações do 4º Centenário de Natal, em 1999, e do 1º Centenário de nascimento do historiador da cidade, Luís da Câmara Cascudo, em 1998, datas de grande e imperecível simbolismo.  Refiro-me, e reitero aqui, ao sucessor de Gumercindo Saraiva – o homem que nos doou Pendências –, Gutemberg Costa, nosso homenageado. Em imagem bem escolhida, pertinente, precisa, sugestiva, o pesquisador empunha uma baladeira, instrumento mortífero covardemente empregado no abate dos pássaros inocentes, descuidados da maldade humana. Gutemberg, como um senhor da vida, assesta a baladeira na direção de um pássaro oculto nas sombras, às costas de aguerridos guerreiros providas.

A foto é inapropriada e inoportuna, pois incita ao ódio, ao trucidamento, ao sacrifício que evoca, indistintamente, uns versos do poeta Diógenes da Cunha Lima, creio que publicado em seu livro de estreia, “Lua 4 Vezes Sol” (Editora Universitária; 1968), do qual constava versos esdrúxulos, sem ritmo nem duende. Gutemberg encarna e interpreta, ao materializar-se no duplo composto em cores vivas, xamânicas, por um alento verbal e um outro imagético. Não há como escapar.

Declara-se Diógenes um menino comedor de corações de rouxinóis, lavrando assim a própria e irrecorrível sentença, tornando-se alvo declarado, alvo dum repúdio popular crescente, irredutível, associando o poeta para sempre em um exterminador de passarinhos. Não lhe bastasse a pecha de antiecológico, declarava-se um matador de passarinhos.

Não sei que estilista sem noção, inteiramente descompensado, teria armado-se de baladeira.  Uma arma exterminadora, primitiva, mortal. Um ato gratuito. Puramente gratuito.

Diógenes terá sido o precursor do abate de passarinhos. Desde cedo que deixou que emanasse seus instintos antiecologológicos, de maus modos, alvo de multas vultuosas para o financiamento de ações culturais e ambientais, as quais são geridas por um comitê civil.

Franklin Jorge, diretor de Redação da Navegos, é autor dos livros “Ficções Fricções Africções” (Mares do Sul; 62 págs.; 1999), “O Spleen de Natal” (Edufrn; 300 págs.; 2001), “O Livro dos Afiguraves” (FeedBack; 167 págs.; 2015), dentre outros.

ARRIBAÇÃ O escritor Gutemberg Costa posa com uma baladeira, “brinquedo/arma” com a qual se abatem passarinhos, dentre eles a espécie Zenaida auriculata (Avoante), que são servidos como petisco em bares e restaurantes no interior do Nordeste; hábito cultural é questionado atualmente por ser antiecológico