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Walmir Ayala em grande estilo

Autor de uma estirpe rara, dotado de múltiplos talentos, foi o gaúcho Walmir Ayala uma espécie de Oscar Wilde tropical que nos assombrou com a variedade e a qualidade de sua produção em diversos gêneros, do poético ao ficcional, do dramático à critica de arte e literária, além do memorialismo que nele constituía uma forma à parte. amigo do Fundador de Navegos, que privou de sua intimidade por muios anos, deixou centenas de manuscritos ainda inéditos à espera de publicação.

*Franklin Jorge

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A Editora Leitura, de Belo Horizonte intentou reeditar livros de Walmir Ayala, um dos poucos autores brasileiros a quem, pela singularidade e qualidade do seu talento criador — expressão de uma personalidade múltipla e única –, podemos chamar de estilista e mestre. Como Machado de Assis, Murilo Mendes, Lúcio Cardoso, Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto, Cecília Meirelles, Cornélio Penna, Ascendino Leite e alguns poucos outros.

Falecido prematuramente, em 1991, deixou Walmir Ayala uma obra vastíssima em prosa e verso, capaz de proporcionar deleite a adultos e crianças, além de ter se notabilizado como um dos mais importantes críticos de arte do país e um incansável e generoso divulgador do talento alheio. Nunca, antes dele, tantos deveram tanto a um ser em tudo especial e único. Sou, com muita honra, um desses de quem Walmir, generosamente, se fez credor para todo o sempre.

A reedição de sua obra esgotada e dos inúmeros inéditos deixados pelo autor gaúcho, que se faz agora pela Editora Leitura e com a colaboração do crítico e herdeiro de Walmir, André Seffrin, representa um ato de justiça para com um criador literário que se destacou em vários gêneros, do romance à poesia, do teatro ao ensaio, do jornalismo à crônica, do diário intimo à literatura destinada às crianças e aos jovens, da critica literária à critica de arte, da qual foi, enquanto viveu, o mais importante e o mais original de todos os tempos, como que a confirmar que o melhor critico é o poet

Em publicações criteriosas e bem cuidadas, está Walmir outra vez ao alcance do leitor, graças a uma iniciativa de editores que prezam, efetivamente, a qualidade e colaboram, através da difusão de bons autores, para que tenhamos uma biblioteca genuinamente brasileira e universal, da qual todos nós, como leitores, podemos nos orgulhar. Não me detenho nos demais autores escolhidos pelo tirocínio dos que fazem a Editora Leitura, mas tão-somente em Walmir Ayala, que a todos representa e resume, sem desmerece-los,  segundo a pluralidade do seu gênio literário a toda prova.

Como romancista, tem Walmir o dom da intensidade sob o aparente minimalismo do enredo, forjado, geralmente, com reduzido elenco de personagens. Mas, quanta complexidade na expressão dos conflitos que convulsionam cada uma dessas almas atadas entre si por um destino inescrutável como a própria divindade que o plasmou. Em tudo, porém, a grande arte literária de Walmir Ayala, como o sinal de uma criação que delata um mestre em seu ofício. O de nos comunicar a essência existencial e metafísica de seres, aparentemente vulgares, flagrados na obscuridade e no silêncio.

As Ostras Estão Morrendo  saiu em primeira edição, ao mesmo tempo que a reedição de À Beira do Corpo, considerado por muitos, além de um livro terrivelmente bem escrito [Assis Brasil], um autentico e grande romance [Otávio de Faria], dos mais belos e lancinantes da literatura brasileira [Ledo Ivo]. Quanto ao primeiro titulo, um curiosíssimo trailer, escrito de forma rápida e elíptica, foi recolhido do espólio de inéditos deixados por Walmir, ao falecer, aos cinqüenta e oito anos. Mas, ninguém se engane – sob o aparente minimalismo do relato, ainda que mal-dissimulado, o torvelinho de sordidez e paixão, também presentes em Á Beira do Corpo, romance há muito esgotado, cuja tessitura dá consistência a uma dicção personalíssima, como tudo o que traz a assinatura de Walmir Ayala, um autor que, por sua grandeza e singularidade, ombreia com um outro gênio das letras, igualmente polivalente em suas formas de expressão – o esteta Oscar Wilde.